R$ 6 milhões para projetos sociais contemplados com verba de penas pecuniárias

Foram 184 projetos inscritos e 43 selecionados para receber financiamento

A pena era prestação de serviços à comunidade e pagamento de pena pecuniária, uma espécie de multa, com finalidade social e reprovação do delito. O condenado, nesse caso, chamado de beneficiário, por ter recebido pena restritiva de direitos e não privativa de liberdade, foi cumprir sua sanção em uma instituição que recebia crianças e adolescentes em contraturno, para reforço escolar. Como cumprimento da pena, ele começou a trabalhar na reforma do local, mas acabou furtando material didático. O responsável flagrou o ato e chamou o beneficiário para conversar. Ele disse: “Já sei, você vai me entregar para a polícia e eu vou ser preso”. O responsável respondeu: “Esse material é dos seus filhos, que estão sendo atendidos aqui”. Resultado, a conscientização levou o beneficiário a cumprir sua pena e trabalhar por anos no local como voluntário.

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A Vara de Execuções Penais de BH vai destinar R$ 6 milhões a 43 projetos (Crédito: Cecília Pederzoli / TJMG)

Quem contou essa história foi a assistente social da Vara de Execuções Penais (VEP) de Belo Horizonte Simone Ceccotti, e ilustra bem o caráter social do financiamento de projetos apresentados por entidade pública ou privada, que atenda a comunidades, com recursos das verbas pecuniárias recolhidas pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). “O beneficiário está lá vendo onde o dinheiro da pena é aplicado. A prestação de serviços é realizada em uma das instituições cadastradas e aprovadas em edital”, comentou. Este ano, dos 184 projetos inscritos, 43 receberão financiamento, totalizando R$ 6 milhões. O resultado foi divulgado na segunda-feira (10/3).

O juiz da VEP de BH Daniel Dourado Pacheco endossou a percepção da assistente social: “Trata-se de um incentivo para aquelas pessoas que estão cumprindo pena nas entidades contempladas, ao ver a aplicação de pena de forma efetiva em projetos sociais, culturais e de prevenção à criminalidade.”

Projetos

Um dos projetos beneficiados é o do Fórum de Entidades do Entorno da Mineração do Acaba Mundo (Femam). Serão repassados R$ 249.998 para reforma da sede da instituição. A verba será para contratação de profissionais que irão ministrar capacitação técnica aos alunos do curso “Comunidade Construtora”. Com o dinheiro também serão adquiridos material de construção, uniformes e Equipamentos de Proteção Individual (EPIs).  Cumpridores da pena de prestação de serviços à comunidade que possuírem conhecimento ligado às atividades de reforma atuarão na parte prática, sendo, portanto, absorvidos no projeto. Simone Ceccotti explicou que eles também podem participar da formação para se profissionalizar, no entanto, isso não conta como hora de prestação de serviço da comunidade. Ao final do projeto, será realizado evento de formação dos alunos e inauguração da associação.

Outro trabalho de construção será realizado pelo Instituto 100% Morro, no Morro do Papagaio, na Capital. Nesse caso, a ampliação é no campo da cultura. Os R$ 80 mil repassados à instituição serão destinados a fomentar a biblioteca da sede e levar a literatura pela comunidade. Serão quatro eventos itinerantes, em fins de semana, que incluirão obras diversas destinadas a crianças, jovens, adultos, idosos e cumpridores de penas alternativas. Todo evento contará com brinquedos infantis, como cama elástica. “Eu falo que estamos sendo contemplados duas vezes. É uma boa ação para os cumpridores de pena, de se redimirem, devolvendo em ação serviços para a sociedade, tendo possibilidade de vida nova, e também o de promover o estreitamento de relação entre famílias, através da cultura e do lazer”, comemorou Elaine Pinheiro dos Reis, presidente do 100% Morro.

Em tom de alegria, ela contou que ouviu crianças dizerem que nunca tinham percebido que os livros poderiam levá-las a um lugar imaginário. Ela lembrou também dos olhos de uma avó que choravam de alegria em um evento que presenteou quem fizesse a melhor leitura. A avó foi surpreendida ao ver um de seus netos lendo. “Ela disse: eu não consegui acompanhar a mãe igual eu acompanho meus netos, não estive com ela em momentos assim, como estou tendo com eles, porque como ela, eu trabalhava muito”, contou a presidente do instituto. “Numa comunidade em situação de vulnerabilidade, com alto índice de criminalidade, onde as crianças são recrutadas para o crime, tudo o que as incentiva a olhar para um futuro diferente é de suma importância”, relatou Elaine.

Segundo ela, o instituto aceita doações de livros de leitura, livros de colorir, lápis de cor, canetinhas e parcerias para manter e ampliar o olhar para a cultura. 

Sabor

Também foi selecionado projeto com “cheiro de fomento”. A Fundação de Assistência Social e Desenvolvimento Humano (Fundap) propôs a estruturação de uma cozinha escola para a fabricação de vários produtos alimentícios, como pão de queijo, bolos, biscoitos, mini pizzas, salgados e marmitas congeladas. Após a estruturação da cozinha, a instituição pretende oferecer cursos de capacitação para geração de renda aos acolhidos em tratamento de dependência química e aos seus familiares. “Ficamos felizes com o resultado. Trabalhamos com causas sociais já há algum tempo. Com essa estrutura, vamos poder multiplicar os atendimentos. Há muita procura para essa área alimentícia. Poderão participar não só os pacientes em fase final de tratamento e familiares, como a comunidade interessada”, celebrou Bruno Max Coelho Coutinho, presidente da Fundação. Ao projeto, serão destinados R$ 215 mil. 

Todos os projetos são, para o juiz da VEP de BH Daniel Dourado Pacheco, exemplares. “Reverter, anualmente, para a sociedade, benfeitorias de caráter essencial à Segurança, Educação e Saúde, por meio da verba pecuniária, ao mesmo tempo em que promove correção educativa do beneficiário, é o demonstrativo do papel do Judiciário: garantir os direitos individuais, coletivos e sociais”, sinalizou.

Dircom-TJMG

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