Morre Jimmy Cliff, ícone do reggae, aos 81 anos

Por O Globo — Rio de Janeiro

Segundo a família, cantor sofreu uma convulsão após quadro de pneumonia
Lenda do reggae, Jimmy Cliff morre aos 81 anos devido a pneumonia

O lendário cantor de reggae Jimmy Cliff, de 81 anos, faleceu após uma convulsão decorrente de pneumonia, conforme comunicado emocionado de sua família. A esposa, Latifa, expressou gratidão pelo apoio ao longo da carreira do músico, conhecido por sucessos como “The Harder They Come”. A família agradeceu a equipe médica e pediu privacidade durante o luto. Detalhes adicionais serão divulgados em breve.

Morreu o cantor e compositor jamaicano Jimmy Cliff, um dos maiores nomes da história do reggae, aos 81 anos. A informação foi confirmada num texto publicado no perfil oficial do artista no Instagram, assinado por Latifa, sua esposa. Segundo o post, Cliff morreu após sofrer uma convulsão causada por um quadro de pneumonia.

“Para todos os seus fãs em todo o mundo, saibam que o vosso apoio foi a força dele durante toda a sua carreira. Ele realmente apreciou cada fã pelo seu amor”, diz o post. Veja a seguir:

Lenda do reggae

Conhecido mundialmente por clássicos como “The harder they Come”, “You can get It if you really want” e “Many rivers to cross”, Jimmy Cliff foi um dos pilares do reggae e do ska jamaicano. Nascido em Saint James, na Jamaica, começou na música muito cedo, cantando em feiras e festas da cidade. Mudou-se para a capital Kingston, aos 14 anos, para se dedicar à carreira de artista.

Ganhou projeção local com hits como “Hurricane Hattie”, “King of kings”, “Dearest Beverley”, “Miss Jamaica”, e “Pride and passion”. Antes de se mudar para a Inglaterra, aos 20 anos, em 1964, assinou com a lendária gravadora Island Records, que também tinha no seu catálogo nomes fortes do reggae como Bob Marley e Toots and the Maytals. Seu primeiro disco foi “Hard road to travel”, lançado em 1967.

A morte ocorre poucos anos depois de ele ter lançado “Human touch”, seu último single, marcado por um retorno ao reggae dos anos 1960 e por reflexões sobre a solidão em tempos de pandemia.

Conexão com o Brasil

Ao longo de sua trajetória, Jimmy Cliff teve forte ligação com o Brasil. Tudo começou em 1968, ele veio ao Rio de Janeiro para o Festival Internacional da Canção, no Maracanãzinho, onde cantou “Waterfall”.

Jimmy Cliff no Maracanãzinho, no Festival Internacional da Canção, em 1968 — Foto: Agência O Globo

Foi aqui que ele compôs, em 1969, “Wonderful world, beautiful people”, considerada uma das primeiras faixas de reggae que ficaram conhecidas fora da Jamaica, entrando nas paradas dos Estados Unidos. No mesmo ano, gravou o LP “Jimmy Cliff in Brazil”, cujo encarte o mostra diante da Praia de Botafogo.

Durante os anos 1980, Cliff esteve tantas vezes no país que virou figura folclórica por aqui. Em 1980, fez turnê com Gilberto Gil, lotando shows por onde a dupla passava. Num deles, antes de subir ao palco ao lado de Gil, recebeu a notícia da morte do pai. Mesmo devastado, decidiu cantar:

— Veio uma energia muito forte aquela noite. Consegui me ouvir cantando com uma força que nunca tinha sentido.

Em publicação esta segunda-feira em suas redes sociais, Gil escreveu: “Jimmy Cliff influenciou e seguirá influenciando minha música. Obrigado por tanto.”

Clipe no Rio

Em 1984, gravou nas praias do Rio o clipe de “We all are one”, dirigido por Tizuka Yamasaki. Entre 1985 e 1986, o Brasil ouviu “Hot shot”, de Jimmy Cliff, na trilha sonora da novela “Ti ti ti”, de Cassiano Gabus Mendes, exibida pela TV Globo. Ainda em 1985, seu álbum “Cliff Hanger” ganhou o Grammy de melhor álbum de reggae.

Tizuka Yamasaki conversa com Jimmy Cliff durante as gravações do clipe do jamaicano no Rio — Foto: Jorge Marinho / Agência O Globo

Em 1991, gravou, na Bahia, em Salvador, o CD “Breakout”, lançado em 1992. O disco contou com as participações de Olodum na canção “Samba Reggae” e do Araketu na faixa-título e em “War a Africa”. Em 1997, participou do disco “Acústico MTV”, dos Titãs, revisitando seu clássico “The harder they come”, que virou “Querem meu sangue” na versão brasileira que também foi gravada, além dos Titãs, pelo Cidade Negra.

Em publicação em suas redes sociais, os Titãs lamentaram a morte do jamaicano: “Hoje a gente perde também um pedaço importante da nossa história. Tivemos a honra de dividir o palco com ele no Titãs Acústico. Vai em paz, Jimmy. Obrigado pela música e pela energia que você deixou por aqui.”

A filha de Jimmy Cliff, Nabiyah Be, fruto do seu relacionamento com a psicóloga Sônia Gomes da Silva, nasceu em Salvador, Bahia, em 1992. Be se tornaria uma estrela do cinema, anos depois, tendo atuado no filme “Pantera Negra”, da Marvel, feito que deixava Cliff orgulhoso.

Racismo em Londres

No começo da carreira em Londres, o público-alvo de Jimmy Cliff era o rock – daí o fato de ele ter regravado canções como “A whiter shade of pale”, do grupo Procol Harum –, mas ele não apreciou a vida na cidade. “Era uma droga… experimentei o racismo de uma maneira que nunca havia experimentado antes”, chegou a dizer. Em 1969, porém, sua gravação de “Wonderful world, beautiful people”, fez grande sucesso no Reino Unido, alcançando o 6º lugar nas paradas.

Depois de compor “Vietnam”, uma canção que pedia pelo fim da guerra, o cantor foi recebido com surpresa. “Os críticos em Londres disseram: ‘Uau! Como ele consegue cantar uma música tão séria e com um ritmo tão alegre?’ E eu disse: ‘Uau! Eu nem percebi que estava fazendo isso. Eu estava apenas compondo uma música com um ritmo.'”, recordou-se.

Cliff voltaria ao Top 10 do Reino Unido em 1970, com um cover de “Wild world”, de Cat Stevens, antes de filmar “The harder they come” (no Brasil, “Balada sangrenta”) em 1972, depois que o diretor Perry Henzell intuiu que ele seria um bom ator.

A trilha sonora do filme, com canções como faiza-título e “You can get it if you really want”, além de outras de Desmond Dekker, Toots & the Maytals e outros, ajudou a levar o reggae a um público mais vasto, especialmente nos EUA, onde o filme foi lançado em 1975.

Em 2022, em entrevista ao jornal inglês “The Observer”, Jimmy Cliff disse que o ambiente de criminalidade retratato em “Balada sangrenta” bem familiar para ele: “Quando cheguei a Kingston, morei em áreas infestadas por gângsteres e, para ser sincero, a única coisa que me impedia de me juntar a essas gangues em era o medo de que minha família descobrisse que eu estava armado em Kingston.”

No cinema, ele ainda teria papéis (bem menores) em “Clube Paraíso” (de 1986, ao lado de Robin Williams) e em “Marcado para a morte” (de 1990, com Steven Seagal).

Ao longo dos anos 1970, o cantor continuou fazendo shows e lançando álbuns. Ele se afastou da música por um tempo em meados e o final da década, viajando para a África para se reconectar com suas raízes ancestrais e acabou se convertendo ao Islã: o álbum “Give thankx”, de 1978, reflete sua vivência nessas viagens.

Conversão ao Islã

Ao longo dos anos 1970, o cantor continuou fazendo shows e lançando álbuns. Ele se afastou da música por um tempo em meados e o final da década, viajando para a África para se reconectar com suas raízes ancestrais e acabou se convertendo ao Islã: o álbum “Give thankx”, de 1978, reflete sua vivência nessas viagens.

Sucessos como “Reggae night” (de 1983, composta por Amir Bayyan e La Toya Jackson, irmã de Michael Jackson) e “Rebel In Me” (de 1990, incluída na trilha sonora internacional da novela “Rainha da Sucata”) se seguiram para Jimmy Cliff. Em 1993, a sua gravação de “I can see clearly now”, de Johnny Nash, tornou-se um hit mundial ao ser incluída na trilha sonora do filme “Jamaica abaixo de zero”.

Em 2012, Jimmy Cliff colaborou com o vocalista da banda punk Rancid Tim Armstrong em um EP e um álbum, este último ganhador do Grammy de melhor álbum de reggae – uma de suas duas vitórias em sete indicações ao longo dos anos. Ele foi conduzido do Rock and Roll Hall of Fame em 2010.

Em publicação no X (antigo Twitter), o primeiro ministro da Jamaica, Andrew Holness, prestou um tributo a este “verdadeiro gigante cultural cuja música levou a essência da nossa nação ao mundo”.

“Através de canções atemporais como ‘Many rivers to cross’, ‘The harder they come’, ‘You can get it if you really want’ e ‘Sitting in Limbo’, Jimmy Cliff contou a nossa história com honestidade e alma”, escreveu. “Sua música elevou as pessoas em momentos difíceis, inspirou gerações e ajudou a moldar o respeito global que a cultura jamaicana desfruta hoje. Agradecemos por sua vida, sua contribuição e o orgulho que ele trouxe à Jamaica. Estendo minhas mais sinceras condolências à sua família, entes queridos e a todos os jamaicanos. Sei que sentimos profundamente esta perda.Descanse em paz, Jimmy Cliff. Seu legado viverá em cada canto da nossa ilha e nos corações do povo jamaicano.”

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